O que o comportamento animal tem a dizer sobre delações?

Conta tudo, mas tudo mesmo, Marcelo! (Foto: Worldsteel; CC BY-SA)

Conta tudo, mas tudo mesmo, Marcelo! (Foto: Worldsteel; CC BY-SA)

Será que o comportamento animal pode nos dizer algo sobre a operação Lava Jato? Outro dia conversava com o colega Ricardo Machado sobre como a Biologia pode nos ajudar a compreender diversos fenômenos. Um exemplo é a delação premiada dos executivos da Odebrecht, que me lembrou um assunto comum no estudo da socialidade, o dilema do prisioneiro.

A vida em sociedade exige uma série de proezas dos animais sociais, uma dessas proezas é a cooperação, o altruísmo ou a generosidade. Em termos evolutivos, se prejudicar para beneficiar outro indivíduo é inaceitável. Só resultaria em você perder a chance de se perpetuar na população em benefício a outro alguém que pode não ter sua postura colaborativa. No entanto, atitudes generosas frequentemente ocorrem em espécies sociais.

Para explicar isso, uma teoria emprestada da economia foi trazida para o estudo do comportamento social: a teoria dos jogos. Ela trabalha com situações simuladas semelhantes a jogos e modela matematicamente as estratégias mais vantajosas. Um desses jogos é o dilema do prisioneiro. Imagine que dois suspeitos são levados sob custódia e interrogados em salas de diferentes. Ambos foram flagrados cometendo um delito menor, algo que lhes renderia uma semana na cadeia. No entanto, tudo indica que pelo menos um dos dois estava envolvido num crime maior. Os investigadores propõem então um acordo, se um dos prisioneiros acusar o outro, mas o outro não o acusar em troca, o dedo-duro sai livre e o dedurado cumprirá um ano de prisão. Se nenhum dos dois delatar ninguém, ambos cumprem apenas a semana que deviam pelo delito menor. Já se ambos se delatarem mutuamente, ambos vão presos por um ano.

Se fosse possível combinar com antecedência, o ideal seria ninguém delatar ninguém. Como nada garante que o outro prisioneiro irá cooperar, os modelos matemáticos sugerem delatar. No entanto, o jogo fica mais interessante quando repetimos as prisões, o que chamamos de iterações. Ao permitir rodadas consecutivas, a estratégia mais vantajosa é agir com seu parceiro do mesmo jeito que ele agiu contigo da última vez, o que torna a cooperação mais comum.

Então delatar só é a melhor saída em alguns casos. Primeiramente, se você nunca mais precisar contar com aquele parceiro, delatá-lo será melhor. Nesse caso, as delações premiadas poderão apontar para pessoas cujas carreiras criminosas já estejam no fim.

Em segundo lugar, entra em jogo o histórico entre os jogadores. A tendência aí é que os delatores poupem aqueles que os têm servido e denunciem quem anda sacaneando. Continuariam livres os bandidos cooperativos.

Por último, a delação pode ser incentivada se o prêmio for mais alto. Se o benefício que o delator receber for valioso, mesmo que o alvo da sua delação esteja sendo um parceiro fiel, a delação poderá ocorrer. A matemática é simples, não vale a pena trocar o certo (um alívio de pena agora) pela duvidosa retribuição numa situação futura. Nesse caso, qualquer um pode ser citado, mas não se pode perder de vista que o sistema penal estará poupando um criminoso para poder botar as mãos em outro.

Em conclusão, corruptos em atividade e cheios de interesses recíprocos provavelmente continuarão se protegendo mutuamente a menos que a justiça esteja disposta a beneficiar muito uma das partes.

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