Inovação Não

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“O que o traz aqui essa noite?”

Foi a pergunta que mais ouvi ontem no jantar de recepção da comitiva do Ministério da Indústria e comércio da Noruega no Copabana Palace.
Fui de terno, porque o traje era ‘business attire’ – que eu só conhecia como ‘esporte completo’, mas também porque tinha esperança que o jantar fosse no Cipriani, o chiquerérrimo restaurante do hotel que eu nunca consegui ir (mas o ministério não está podendo tanto assim e só contratou um buffet para as quase 400 pessoas que estavam lá. Mesmo assim, o bacalhau era norueguês e estava uma delícia). Mas apesar de toda a beca, os gringos olhavam com um quê de espanto (porque noruegueses sóbrios não conseguem demonstrar uma emoção inteira, apenas um esboço dela) para aquele cabeludo queimado de praia no meio de todos aqueles empresários loiros e de olhos azuis.
O espanto inteiro aparecia quando eu dizia que era professor da UFRJ. Se até crianças de 8 anos ainda possuem uma imagem estereotipada do cientista como maluco, imagina os CEOs de 60 anos?
Mas felizmente aprendi a lidar com as caras de espanto e com os preconceitos estereotipados e acabava explicando que estava junto com o Instituto Internacional de Pesquisa de Stavanger, ou IRIS, na sigla em inglês. Eles prestam serviços para a indústria de petróleo e gás e querem, assim como toda a indústria do petróleo Norueguesa, expandir para o Brasil. Para o Rio de Janeiro mais especificamente. Para isso precisam envolver universidades locais e… é ai que eu entro.
Mas nem tudo é festa e minha participação não se restringiu ao evento social. Hoje de manhã lá estava eu no auditório do novo prédio da COPPE na UFRJ para o evento “Brazil – Norway R&D and Technology Innovations: Moving forward on bilateral collaboration”. Foi educativo, mas frustrante. Vou explicar porquê.
Eu sei que estou divagando um pouco, mas preciso fazer mais um parênteses (fiquem comigo que tudo vai fazer mais sentido mais pra frente).
Nos primeiros anos da faculdade de biologia, estavam na moda a criação de animais exóticos, como rãs e camarões da malásia. Eu achei que essa era uma boa oportunidade para ganhar a vida como biólogo, talvez até virasse fazendeiro. Mas logo logo descobri que as chances de negócio eram muito superestimadas e que quem ganhava dinheiro realmente com rã e camarão era quem dava curso e vendia livro e apostila sobre ‘como ganhar dinheiro com rã e camarão’.
Bom, essa é um pouco a minha percepção quando vejo alguém falar de inovação. Seminários organizados com pompa e circunstância, experts no assunto, envolvimento de diferentes agências governamentais, muitos ‘CEOs’, mas inovação mesmo…. muito pouca, ou nenhuma. Só ganha dinheiro quem vende livros sobre inovação.
Durante a manhã e a tarde, representantes de 7 universidades (pelo lado brasileiro UFRJ, PUC_Rio, USP e UNICAMP) e 7 empresas apresentaram seus projetos, expertises e áreas de cooperação. Tudo E-X-A-T-A-M-E-N-T-E igual! Em alguns casos, poderiam até ter trocado a apresentação de um pela do outro, porque TODOS tinham as MESMAS PROPOSTAS para o futuro a indústria de óleo e gás.

Em nenhum momento, nem uma vez, foi falada a palavra Biotecnologia. Até entendo que os engenheiros ignorem o tema. Afinal, quando sua única ferramenta é um martelo, você tende a ver todos os problemas como pregos, diz o provérbio. Mas será que nenhum gerente ou diretor de empresa conhece o potencial da biotecnologia para resolver problemas? Eles precisam ler mais o VQEB!
A biotecnologia é cara e demorada, é verdade, mas dá resultados impressionantes. Pergunte a quem toma insulina humana produzida por camundongos.
A indústria do petróleo, estou confirmando, gosta mesmo é de trabalhar na sua ‘zona de conforto’. Afinal, para que se preocupar? É como se ouve por ai: “o melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada. O segundo melhor, é uma empresa de petróleo mal administrada”.
Mesmo esse biólogo aqui adora dirigir o seu carro e não regula o consumo de gasolina. O Petróleo será explorado, processado e vendido, até se esgotar, com ou sem inovação.
Dá próxima vez, bebo mais no jantar e durmo até mais tarde.

Discussão - 5 comentários

  1. Suzane disse:

    Fácil falar de inovação pensando somente em tecnologia que otimize o uso de combustiveis ou sem ter posto os pés num laboratório e achar que é muito caro. A biotecnologia abre muitas portas para coisas impressionantes e realmente inovadoras, mas dá trabalho e exige muito tempo e paciência. Coisas que a industria não valorizam, pois querem o retorno rápido do investimento.

  2. Marcelo, disse:

    Falou tudo no final, deixa o petróleo acaba. Hoje já sabemos que passamos do chamado pico do óleo, então quando estiver no finalzinho eles vão correndo em todas as universidades do mundo fazer um "projeto Manhattan", mas enquanto da lucro eles não vão largar o osso.

  3. José Marcello disse:

    Triste isso. Saímos da idade da pedra e não foi por falta de pedra. O que estamos esperando?

  4. Matheus disse:

    Bom dia,
    Acabei caindo de para quedas nesse post, não sei nem se vai chegar a ler isso, mas enfim.
    Eu sou técnico, eletrotécnico na verdade, infelizmente ainda não tive oportunidade de fazer um curso superior (falta de tempo e vergonha na cara).
    Hoje em dia trabalho em uma empresa de petróleo, e preciso concordar que sair da zona de conforto é extremamente complicado. Aqui mesmo recusamos várias ferramentas novas, simplesmente pelo fato de que elas saem muito do que fazemos normalmente. Justificam esse medo falando dos gastos envolvidos numa operação deste tipo são muito altos (Trabalho com avaliação de formações, levantamento de dados para verificar viabilidade econômica do campo, dados de P/T, essas coisas). Chega a ser irritante.
    Mas a dúvida que me veio é a seguinte: de que forma podemos aplicar biotecnologia nesta indústria? Acredido que em áreas relacionadas a refino ou transporte, ou algum tipo de controle das bactérias que produzem H2S nos reservatórios? Qualquer ferramente que otimize o trabalho com segurança é válida, mas dessa vez eu empaquei =/
    Se puder me tirar essa dúvida, ou pelo menos me direcionar, eu agradeço demais.

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