Ativismo Científico

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Mais de 5.000 exibições do vídeo, mais de 3.000 “curti” no facebook, mais de 350 doadores, mais de R$ 40.000 arrecadados em 60 dias. Com a participação da galera, da Bio Bureau, da Ikzus e do Canal Asas, superamos a nossa meta e vamos fazer o genoma do mexilhão dourado!

Primeiros ou não, o nosso Crowdfunding Científico foi um sucesso! Mobilizou a mídia mais do que poderíamos imaginar (veja as reportagens no final da página) e trouxe a tona a invasão do mexilhão dourado, uma catástrofe há mais de 10 anos nos nossos ambientes aquáticos. Estamos orgulhosos da nossa iniciativa, mas ainda há muito o que fazer.

Me surpreendeu, no entanto, a indignação de muitas pessoas quando viram o projeto:

“É um absurdo que o governo não financie essa pesquisa!”;

“Tem dinheiro pra Copa mas não pra ciência!”;

 “Esse é o retrato da ciência no Brasil!”

O brasileiro é um povo muito solidário. Mas talvez por não ter uma população rica, essa solidariedade não tenha se consolidado em uma cultura de doação financeira forte, como acontece nos EUA e outros países do mundo. Acaba parecendo estranho pedir doações. Como se fosse pedir caridade. Quase mendigar.

A principal motivação da nossa iniciativa não foi financeira e a importância dela transcende os R$40.000 que pedimos.

O finaciamento de C&T no Brasil existe. Nossa linha de pesquisa com o mexilhão já foi financiada pelo MMA (2007) e CNPq (2010) em outras ocasiões. A verdade é que não se faz pesquisa, em nenhum lugar do mundo, sem financiamento governamental pesado. Nosso laboratório nunca teria sido montado sem os muitos editais, principalmente da FAPERJ, que nos apoiaram ao longo dos últimos 10 anos.

Mas também é verdade que o financiamento de C&T no Brasil é disperso e inconstante, o que deixa um espaço enorme para novas iniciativas, como o uso do crowdfunding, para financiar ciência. E prestem atenção no que eu digo: o crowdfunding científico vai se tornar uma estratégia fundamental para a ciência brasileira. Um modelo criativo para estimular a produção de inovação no Brasil.

Mais do que os R$ 40.000, queriamos mobilizar da população para um projeto científico. E também nisso, o sucesso foi absoluto! Estagiários, colaboradores, trabalhadores voluntários, patrocinadores, reporteres, fãs… todos eles apareceram.

Nossa base de doadores fala mais do que o brasileiro pensa da ciência do que as pesquisas de opinião do MCT, porque não é só a opinião: é o fato! As pessoas querem se associar a pesquisas científicas e estão até dispostas a contribuir financeiramente para isso.

De fato, existe interesse pela ciência. Só precisamos de mais ativismo científico.

Que eu garanto para vocês, não vai faltar.

Crowdfunding do Genoma do Mexilhão Dourado na Mídia:
  • Revista Galileu
    http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI339200-17770,00-CROWDFUNDING+FINANCIA+PROJETO+CIENTIFICO+PELA+PRIMEIRA+VEZ+NO+BRASIL.html
  • Giovana Girardi no Estado de São Paulo.
     http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,biologos-fazem-vaquinha-para-decifrar-genoma-do-mexilhao-dourado,1040012,0.htm
  • 'Internautas ‘versus’ invasor cascudo' na Ciência Hoje
     http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2013/06/internautas-2018versus2019-invasor-cascudo
  • Crowdfunding Científico é “revolucionário” no Jornal da Ciência
     http://www.jornaldaciencia.org.br/impresso/JC737.pdf
  • Crowdfunding Científico no Jornal O Globo!
     http://oglobo.globo.com/ciencia/ciencia-brasileira-estreia-no-financiamento-coletivo-8255561
  • Cientistas arrecadam dinheiro para desvendar DNA no G1
     http://g1.globo.com/natureza/noticia/2013/04/cientistas-arrecadam-dinheiro-na-web-para-decifrar-dna-de-mexilhao-invasor.html
  • Financiamento coletivo ajuda o desenvolvimento de projetos no país na Globo News:
     http://globotv.globo.com/globo-news/jornal-das-dez/t/todos-os-videos/v/financiamento-coletivo-ajuda-desenvolvimento-de-projetos-no-pais/2538668/
  • Quer batizar um gene? no Site Planeta Sustentável:
     http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/blog-da-redacao/quer-batizar-uma-proteina-ou-um-gene-e-so-investir-no-genoma-do-mexilhao-dourado/
  • Quer batizar um gene? no Blog a revista Super Interessante:
     http://super.abril.com.br/blogs/planeta/quer-batizar-uma-proteina-ou-um-gene-e-so-investir-no-genoma-do-mexilhao-dourado/

Mais sobre genomas e 'mainframe' da vida

ResearchBlogging.org

O Coelacantus Africano é o parente mais próximo dos primeiros peixes que se aventuraram por terra firme LAURENT BALLESTA/ANDROMEDE OCEANOLOGIE

O Coelacantus Africano é o parente mais próximo dos primeiros peixes que se aventuraram por terra firme
LAURENT BALLESTA/ANDROMEDE OCEANOLOGIE

Enquanto sequenciamos o genoma do mexilhão dourado (PARTICIPEM!!!) outros grupos sequenciam outros genomas. Hoje descobrimos que um pessoal da Paraíba montou a primeira plataforma de crowdfunding dedicado ao sequenciamento de genomas (parabéns pessoal!) e hoje também saiu na Nature o sequenciamento do genoma de um peixe ancestral, o ‘fóssil vivo’ Coelacantus.

Abre parênteses: Fóssil vivo é uma péssima ótima expressão. Da mesma forma que uma coisa não pode ser ótima e péssima ao mesmo tempo, um fóssil não pode estar vivo. Mas ela significa que acreditava-se que esse peixe estava extinto há milhões de anos, até que em 1938 um pescador puxou um na sua rede nas águas da África do Sul. Fecha Parênteses.

Coelacantus fossil

As duas espécies desse peixe que se acreditava extinto, vivem uma na África e a outra na Indonésia. Apesar dessa cara de bicho pré-histórico, essas duas espécies que se separaram aproximadamente 6 milhões de anos atrás (mais ou menos na mesma época que os primatas se separaram no grupo que formaria os humanos de um lado e os chimpanzés do outro) tem tantas semelhanças em nível genético (no gene HOX ligado ao desenvolvimento embrionário), que os especialistas chegaram a conclusão que sua evolução é lenta… muito lenta. Juntando isso com as baixas pressões seletivas do fundo do mar, onde esses bichos vivem… temos um ‘fóssil vivo’.

Da mesma forma que estamos sequenciando o genoma do mexilhão dourado para saber mais sobre ele e poder combatê-lo, os pesquisadores estão estudando o Coelacantus para poder entender a transição entre o ambiente marinho e terrestre, ou como os peixes evoluiram para os tetrapodes (animais com 4 patas). Esse peixe tem ossos nas barbatanas, uma das demandas para ‘invadir’ o ambiente terrestre. E essa é já uma das informações que o genoma trouxe: mostraram que esses peixes já possuem uma sequencia regulatória (não o gene em si, mas aquelas sequencias que fazem com que um gene seja ‘ligado/desligado) que ativa os genes para o desenvolvimento de ‘membros’ similar a dos tetrapodes.

Outras particularidades aparecem justamente nas regiões do DNA que não codificam genes (regiões não-codificantes): o Coelacantus tem um monte de ‘transpossomos’ que são sequencias de DNA móveis, provavelmente resquícios de infecções virais, que ficam pulando de um lado para o outro do DNA (e podem ter grande importância evolutiva). E uma curiosidade… bom, pelo menos pra quem é NERD sexy que nem eu, é que eles não possuem imunoglobulina M, uma proteína do sistema imune que tooooooodo mundo tem. E sistema imune de outros bichos, vocês já sabem que a gente adora.

Será que esse bicho fica bom na Muqueca?

Amemiya, C., Alföldi, J., Lee, A., Fan, S., Philippe, H., MacCallum, I., Braasch, I., Manousaki, T., Schneider, I., Rohner, N., Organ, C., Chalopin, D., Smith, J., Robinson, M., Dorrington, R., Gerdol, M., Aken, B., Biscotti, M., Barucca, M., Baurain, D., Berlin, A., Blatch, G., Buonocore, F., Burmester, T., Campbell, M., Canapa, A., Cannon, J., Christoffels, A., De Moro, G., Edkins, A., Fan, L., Fausto, A., Feiner, N., Forconi, M., Gamieldien, J., Gnerre, S., Gnirke, A., Goldstone, J., Haerty, W., Hahn, M., Hesse, U., Hoffmann, S., Johnson, J., Karchner, S., Kuraku, S., Lara, M., Levin, J., Litman, G., Mauceli, E., Miyake, T., Mueller, M., Nelson, D., Nitsche, A., Olmo, E., Ota, T., Pallavicini, A., Panji, S., Picone, B., Ponting, C., Prohaska, S., Przybylski, D., Saha, N., Ravi, V., Ribeiro, F., Sauka-Spengler, T., Scapigliati, G., Searle, S., Sharpe, T., Simakov, O., Stadler, P., Stegeman, J., Sumiyama, K., Tabbaa, D., Tafer, H., Turner-Maier, J., van Heusden, P., White, S., Williams, L., Yandell, M., Brinkmann, H., Volff, J., Tabin, C., Shubin, N., Schartl, M., Jaffe, D., Postlethwait, J., Venkatesh, B., Di Palma, F., Lander, E., Meyer, A., & Lindblad-Toh, K. (2013). The African coelacanth genome provides insights into tetrapod evolution Nature, 496 (7445), 311-316 DOI: 10.1038/nature12027

Venha fazer ciência com a gente!

 

Vou fazer duas perguntas as quais tenho certeza que você vai responder, “Sim”:

Você já quis ser cientista?

Você já quis fazer alguma coisa pela Amazônia?

Claro, não é?!

Estamos te dando a chance de fazer as duas coisas. O laboratório de Biologia Molecular Ambiental criou o primeiro crowdfunding científico brasileiro para sequenciar um genoma. Um crowdfunding é um projeto de financiamento coletivo, onde quem contribui se torna um pouco dono do projeto.

O alvo é o mexilhão dourado, Limnoperna fortunei, uma espécie invasora, uma praga que veio da Ásia e agora está ameaçando a biodiversidade da Amazônia. O video explica tudo direitinho.

Venha participar do sequenciamento do mexilhão dourado

Venha participar da aventura da descoberta científica com a gente. Você contribui financeiramente com o projeto e nós colocaremos o seu nome nos genes e proteínas que identificarmos. Legal né?!

Meio NERD?! É, mas você sabe, NERD é o novo Sexy!

O 'Mainframe' da vida


As vesículas dobradas estão presentes em células de todos os tamanhos e idades. Os grânulos são principalmente compostos de proteínas antimicrobianas, que são despejadas na hemolinfa durante um desafio, e depois para evitar uma nova invasão, do mesmo jeito que anticorpos depois de uma infecção.

As vesículas dobradas estão presentes em células de todos os tamanhos e idades. Os grânulos são principalmente compostos de proteínas antimicrobianas, que são despejadas na hemolinfa durante um desafio, e depois para evitar uma nova invasão, do mesmo jeito que anticorpos depois de uma infecção.

Raramente escrevo aqui sobre o meu trabalho. Poderia mentir, dizer que é modéstia ou alguma coisa assim, mas não é. Acho que o que eu faço no laboratório, pelo menos até hoje, não dava uma boa história. Acho que isso nem é verdade, mas sabe como é: casa de ferreiro, espeto de pau.

Mas essa semana publicamos um artigo… lindo! Mas lindo mesmo! Do jeito que dá orgulho de ser cientista. Fizemos tudo direito: o desenho experimental foi correto, os dados foram bem coletados, fizemos a análise correta e uma discussão inovadora.

Tão inovadora que… o revisor disse que ela era especulativa demais. Mas até nisso esse artigo funcionou: o revisor, que muitas vezes pode ser um idiota (veja aqui essa satira incrível de Hitler reclamando do terceiro revisor – se você não é cientista, talvez não se divirta tanto), foi sensacional: nos apontou na direção correta e, depois de bater a cabeça por um mês (as vezes na parede, as vezes nos pulsos uns dos outros) fizemos um artigo muito, muito bom.

“o parágrafo final é perfeito”. Gente… tenho só 40 anos e já vivi o suficiente para ouvir um revisor dizer isso!

Mas sobre o que é esse artigo que estou falando tanto, que me fez ir até o meu currículo Lattes e apagar uma estrela antiga para poder dizer que ‘esse’ é um dos meus 5 artigos mais importantes?

Eu poderia dizer, corretamente, que é sobre o sistema imune de ostras. Mas ai você poderia dizer, mas e eu com o sistema imune de ostras? Elas são uma delícia com sal e limão, e isso é que importa!

Bom, eu tenho que concordar que elas são uma delícia. Mas isso não desmerece o sistema imune delas. Os bivalves são um dos grupos animais com maior número de espécies. Ocupam todos os mares, rios e lagos. Alguns, como o mexilhão dourado, são pestes, invasores extremamente vorazes e eficientes. Isso, vivendo em um ambiente hostil: concentração de bactérias e vírus na água chega a 10ˆ6 e 10ˆ9 por mililitro!

E como elas conseguem ser tão eficientes, em ambientes tão diferentes quanto hostís? Uma das respostas é: com um bom sistema imune!

E quando eu falo em sistema imune você já pensa logo em anticorpos, linfócitos, imunoglobulinas… mas não, esses animais são muito anteriores ao sistema imune adaptativo dos mamíferos. Eles só possuem sistema imune inato. E que se resume a, e essa foi uma das nossas descobertas, um tipo de célula apenas! Só que essas bichinhas são sinistras! Fagocitam bactérias, metralham elas com espécies reativas de oxigênio e, pra garantir que elas não apareceram mais, disparam peptídeos anti-microbianos dos seus grânulos na hemolinfa do bicho. Se você for biólogo e entender de imuno, posso dizer em um linguajar mais técnico: desgranulam igual macrófagos!

E isso é que é o bacana. Apesar de não terem o sistema imune adaptativo que nós temos, nós temos o sistema imune inato que elas tem. Verdade, nós produzimos apenas um poucos tipos de defensinas, enquanto elas produzem um monte. É é justamente o estudo dessas proteínas de defesa que tem mostrado, por um lado, o que pode ser a origem do sistema imune adaptativo, e de outro, toda uma estratégia para combater as bactérias resistentes a antibióticos.

E você que pensou que elas serviam apenas para petiscos…

Nosso laboratório estuda isso: as relações entre os genes dos organismos e o seu ambiente, e como isso pode nos ajudar a resolver problemas ambientais e de saúde humana. Ou, como disse lindamente a professora Claudia Lage quando leu o texto: “Adoro esses estudos que mostram o ‘mainframe’ da vida”.

Eu também!

Rebelo, M., Figueiredo, E., Mariante, R., Nóbrega, A., de Barros, C., & Allodi, S. (2013). New Insights from the Oyster Crassostrea rhizophorae on Bivalve Circulating Hemocytes PLoS ONE, 8 (2) DOI: 10.1371/journal.pone.0057384

Diário de um Biólogo – 2a Feira 13/08/2012 – As invasões bárbaras

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“Também estaremos em ‘Tara’ nesse final de semana. Vamos fazer um ‘barbecue’ no Domingo. Venham encontrar a gente!”
E foi assim, facinho, facinho, que meu amigo Lazar Obradović nos convenceu a ir ao Lago Zaovine no meio do no parque nacional das montanhas de Tara, na fronteira da Sérvia com a Bósnia-Herzegovina.
Estou em merecidas ferias pelo leste europeu e depois de um final de semana no barulhento festival de trompetes de Guča, uma noite na tranqüilidade da montanha não seria nada mal.
Passamos Mokra Gora, a cidade que Kusturica (pronunciado como zz onde se lê c) construiu para um de seus filmes muito doidos, passamos pela simpática Mitrovac (novamente com zz) e chegamos ao lago no cair da noite. Lazar, a mulher Nevena e uma trupe de amigos mergulhadores nos esperavam com a carne de porco na brasa e Slivovica (sempre zz), a Rakja feita de Marmelo e “engarrafada com trovão” como eles dizem aqui.
Lazar é fanático por mergulho e enquanto comíamos um Croassant no aeroporto de Paris, naquelas 32 h de espera por um vôo que torna duas pessoas amigas pro resto da vida, ele descobriu que eu era biólogo marinho e me perguntava tudo, sobre todos os bobos e plantas que já havia visto embaixo d’água, em todos os mergulhos que já havia feito na vida. Eu levei um tempo até convence-lo que era biólogo marinho e não um atlas da vida marinha (ou foi ele que parou de perguntar quando descobriu que sabia mais sobre peixes e invertebrados do que eu – que hoje estou mais para biólogo molecular do que marinho).
O assunto veio a tona naquela noite, quando a instrutora croata de mergulho, Tanja, comentou sobre a enorme quantidade de moluscos que tinha visto mais cedo: “Pergunta pra ele que é biólogo!”
Ao que parece, uma grande quantidade de moluscos mortos, seguida por uma quantidade maior ainda de moluscos vivos, tinha chamado atenção dos mergulhadores.
Eu falei que a minha especialidade eram os bivalves marinhos. “Ah… Bi-valves. Com duas conchas?” Respondi que sim e eles confirmaram então que era realmente um bivalve no fundo do lago. Continuei dizendo que minha experiência com bivalves de água doce era com o Mexilhão Dourado, Limnoperna fortunei, o qual estamos seqüência do o DNA em nosso laboratório. Expliquei que era uma espécie invasora, que havia chegado no Brasil trazida por água de lastro e que além dos prejuízos econômicos por entupimento de tubulações industriais e fixação em embarcações, ameaçava a diversidade de toda fauna aquática brasileira: do pantanal e até da Amazônia. As pessoas ‘normais’ se preocupam com a poluição aquática, mas a invasão biológica é um risco muito, muito maior para a diversidade de qualquer ecossistema.
A curiosidade de ambos os lados foi aumentando até o momento que eu perguntei se poderia mergulhar com eles no dia seguinte. Ficou combinado que eu iria com Bojidar, o instrutor Sérvio, casado com a instrutora Croata, que parece um daqueles fuzileiros-mergulhadores SEAL de filme americanos, mas que é um doce de pessoa.
O dia seguinte foi uma aula prática de limnologia. Igualzinho eu ouvira falar nas aulas de ecologia da faculdade, onde os exemplos de livros são quase todos de ambientes temperados.
Eu estava super excitado porque seria o meu primeiro mergulho em água doce, ainda por cima em um lago de altitude e em um lugar belíssimo. Mas o pessoal logo me desanimou: a visibilidade era super baixa por causa da eutrofização e não mergulharíamos no lado onde uma vila inteira foi alagada. Veríamos apenas muitas pedras e muitos bivalves.
Entramos na água e quando passamos de 8 m de profundidade, a temperatura passou de 22oC para 13oC! T-R-E-Z-E! Milhares de agulhas pareciam espetar os poucos centímetros quadrados de rosto fora do neoprene de 7mm de espessura. “Lagos profundos de ambientes temperados se estratificam durante o verão, quando a água quente se ‘acumula’ na superfície” parecia que eu estava ali ouvindo o professor Chico Esteves. Maldita termoclina! Pobres fitoplânctons.
E aí então eu os vi… Um mar de mexilhões! E não é que… Nossa, como não pensei nisso antes… Mas é claro… As conchas listradas não deixavam duvida.

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O ‘molusco’ do Lago Zaovine era Dreissena polymorpha, o “mexilhão zebra” a mais notória das notórias espécies invasoras, o mexilhão do sudoeste da Ásia que invadiu e reinvadiu as águas da Europa ocidental e América do Norte, reestruturando ecossistemas inteiros como o dos ‘grandes lagos’ dos Estados Unidos e Canadá e causando bilhões de dólares de prejuízos para a industria de tratamento de água e produção de energia.
Só um NERD como eu para, no meio de uma viagem maravilhosa, me emocionar de ‘mergulhar com o inimigo’.

Ecologia é Biofísica, que é Ecologia.

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Na semana passada falei para os alunos do curso de graduação em Biofísica e Nanotecnologia da UFRJ sobre Biofísica e Ecologia. Mais precisamente sobre a semelhança entre esses dois ramos das ciências biológicas. A aula tem 1:30h, mas eu dividi em blocos de 4-12min por assunto ou conceito, assim fica mais fácil só consultar uma parte. Você pode acionar o vídeo e acompanhar a apresentação no prezi acima.
Parte 1: Apresentação. Terra está viva! Hipótese Gaia. Conceito de retroalimentação.

Parte 02: (só) A Hipótese Gaia.

Parte 3: Apresentação. Hipótese Gaia. O modelo do mundo das margaridas e a autoregulação da Terra pelos organismos.

Parte 4: Relação entre os conceitos de homeostase e estresse entre organismos e ecossistemas. Relação com o conceito de poluição.

Parte 5: Estresse em sistemas biológicos de escala planetária. Explosão do Vulcão Pinatubo e definição termodinâmica de poluição.

Parte 6: A Origem da vida.

Parte 7: Sistema de informação genética primitivo e o ancestral comum.

Parte 8: Genes conservados filogeneticamente e utilização de modelos não-tradicionais em pesquisa.

Parte 09: Carlos Chagas Filho: O ‘Homem Tropical’ e a criação de um modelo de pesquisa para o Brasil.

Parte 10: O mercúrio na Amazônia e a abrodagem ecossistêmica para problemas de saúde humana.

Parte 11: Invasão biológical e o risco do mexilhão dourado na Amazônia

Parte 12: Encerramento. Uma nova definição para biofísica.

Força é igual a massa vezes a aceleração

No início do ano visitei a usina hidroelétrica binacional de Itaipu. Um dos projetos de pesquisa que participo envolve uma espécie de mexilhão invasora. O mexilhão dourado (Limnoperna fortunei). O que é uma espécie invasora, vocês vão perguntar?

Esses mexilhões são originários da China e chegaram pelas nossas bandas (mais precisamente no Rio da Prata em 1991 e na Lagoa dos Patos em 1998) transportados na água de lastro dos navios cargueiros. Imaginem, um navio parte do porto de Xangai para vir ao Brasil e levar soja de volta para os chineses. Mas se ele não estiver carregado com mercadorias, precisa se encher de água, a água de lastro, para equilibrar seu peso e, literalmente, não quebrar no meio quando estiver navegando. Ai, quando chega no porto de Rio Grande, o navio joga na Lagoa dos Patos a água do Rio Yangtze, cheia de larvas de mexilhões dourados (e outros bichos).

Sem predadores naturais, esses animais se desenvolvem enormemente nas nossas águas e criam toda sorte de prejuízos a embarcações, estações de tratamento de água, usinas hidroelétricas, sem contar as espécies locais de bivalves e a vegetação das margens.


Bom, mas voltando ao assunto, em Itaipu tem mexilhão dourado e ainda que isso (ainda) não represente um problema econômico pra eles, essa foi a razão da minha visita. Porém, quando chegamos lá, os mexilhões são o que menos chama atenção. É uma obra monumental. Liguei pro meu pai, e ele, engenheiro, ficava até emocionado de falar de uma obra tão imponente.

Não é para menos. Em 1982 a barragem represou o Rio Paraná, inundando uma região de 1.350 km2 e com mais de 200 km de extensão. Tudo bem, eles tiveram de inundar “Sete quedas” mas eu senti menos esse baque porque era pequeno demais. Mas me lembro até hoje da noite em que o Jornal Nacional mostrou as comportas se fechando as cachoeiras pela última vez.


Enquanto estavamos lá, o Rio Paraná, em uma cheia atípica, precisava ser escoado. Por isso, as comportas do lado esquerdo da barragem estavam abertas. A água saindo pelo chamado ‘vertedouro’ tem uma força impressionante. Tão grande que acabaria, simplesmente, escavando o leito do rio, que fica 180 m abaixo da linha d’água do reservatório, se despencasse direto lá de cima. Então a água desce por um tipo de escorrega, sendo lançada no ar pra dissipar toda a sua energia, antes de continuar seu caminho rio abaixo. Não deu pra entender direito? Dá uma olhada nas fotos e no filminho que eu fiz.

Mas toda essa introdução foi para dizer apenas um parágrafo. O que me emocionou, ou melhor, me assustou, ou melhor ainda, me comoveu de forma assustadora, foi ver a força da água descendo pelo vertedouro. A Força da Natureza, lado a lado com o enorme esforço de engenharia para conte-la. O vácuo que se forma na base do escorrega, capaz de arrancar os capacetes de nossas cabeças (como no filme), o rugido da água, a velocidade… é como se a água dissesse:

– Não esqueça que eu estou aqui!

A fera foi contida, mas não foi domada. É um equilibrio delicado. E quando venta, venta forte!

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