O que andei vendo no Netflix em janeiro

Três variações sobre o tema da arte: a arte de criar e vender brinquedos, a ciência que investiga falsificações artísticas e a arte como porta de entrada para os imigrantes recém-chegados aos EUA.


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E pluribus unum: o sonho americano [Out of Many, One: the immigrant’s story | 34 min. | 2018] — A fila contorna a esquina de um imponente edifício de Nova York. Será o lançamento de um smartphone? Audições para figurantes de um filme hollywoodiano? Gente comprando ingresso para o último sucesso da Broadway? Nada disso. Na verdade trata-se de uma cena tipicamente americana: é uma fila de imigrantes. Mas o grande prédio não é nenhuma empresa que está contratando estrangeiros a baixos salários. Ao contrário. A fila, ali, é para entrar na Sociedade Histórica de Nova York. É assim que começa esse documentário curto porém indispensável para quem quer discutir a questão migratória dos EUA em particular e do mundo em geral. Nesta produção do Netflix, acompanhamos grupos de imigrantes que frequentam a Sociedade Histórica nova-iorquina com o objetivo de estudar a história americana para a prova que se realiza durante o processo de obtenção da cidadania.

Em meio a quadros, esculturas e folhetos, encontram-se pessoas como um professor de Física chinês (há 20 anos nos EUA), um casal de colombianos (30 anos de América e veterano do 11 de setembro), uma cozinheira mexicana, uma ex-ministra da Venezuela — e a própria orientadora das oficinas, migrante originária da Holanda que agora ajuda os recém-chegados a conhecer o novo país. As histórias destes personagens vão sendo apresentadas aos poucos, entremeadas com perguntas e simulados para a prova de naturalização e discussões sobre o atual cenário político norte-americano. Pelo namorado, pelos filhos, pelos estudos ou por motivos políticos e ideológicos — os motivos por trás desses imigrantes são múltiplos, mas todos terminam com um objetivo em comum: tornar-se cidadão dos Estados Unidos. Dirigido por John Hoffman e Nanfu Wang, com depoimentos em inglês, espanhol e chinês, este documentário só tem dois defeitos: 1) ainda que pareça maior do que é, na verdade é curto demais. 2) deixa de fora a vida mais problemática dos imigrantes que chegam ilegalmente. Não seria difícil corrigir o filme, portanto: bastaria dar voz aos ilegais para conseguir algo mais longo, mais profundo e que retrata a realidade da maioria dos que buscam um lar nos Estados Unidos.

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Brinquedos que Marcam Época [Toys that made us | 2018 | 2 temporadas] — Não importa se você foi (ou ainda é) criança. Se você nasceu no último meio século é muito provável que tenha brincado com bonequinhos — Star Wars, He-Man, GI Joe, Barbie. Também deve conhecer os carros metamórficos de Transformers, os blocos coloridos de Lego, algum brinquedo de Star Trek ou um dos inúmeros itens da gatinha sem boca, a Hello Kitty. Em nossas brincadeiras, costumávamos criar histórias com esses personagens — mas qual é a verdadeira história por trás de cada um? Nesta série original Netflix, com 8 episódios (cerca de 45 min. cada) divididos em duas temporadas, mergulhamos no processo de criação destes brinquedos, nos bastidores de suas produções, conhecemos suas diversas variantes e ficamos sabendo dos altos e baixos de cada fabricante.

Divertida e cativante inclusive na versão dublada (cujo único deslize é chamar o programa de Brinquedos da Nossa Infância), a narração nos mostra as raízes alemãs da Barbie, a pequena empresa que apostou em Star Wars, os exageros que deram fim à linha He-man, a mistura de engenhosidade japonesa com as histórias da Marvel em Transformers, os semi-esquecidos produtos de Star Trek, a ascensão (e quase falência) da Lego e a transformação contínua (e as polêmicas) de Hello Kitty, ícone onipresente da cultura kawaii. Além das entrevistas com os designers, empresários, animadores, publicitários e fãs desses fenômenos bilionários, são apresentados itens raros, coleções inteiras e discutidos vários aspectos desses brinquedos: os bonequinhos para meninos estimulam a violência? As bonecas e coisas fofas são exclusivamente pras meninas pequenas? Há espaço pro Lego num mundo digital? E, afinal, a Hello Kitty tem ou não tem boca? A seguir, o trailer da 2ª. temporada (em inglês):

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Arte ou Fake? [Fake or Fortune? | 2015 | 1 temporada] — Todo cuidado é pouco diante de uma imagem que circula pelas redes sociais: por mais crível que nos pareça, o conteúdo pode ser falso e a autoria pode ser mal-atribuída. No mundo das artes plásticas, porém, esse problema é bem mais antigo. Nesta série documental, produzida pela BBC desde 2011, o marchand Philip Mould, a jornalista Fiona Bruce e o historiador Bendor Grosvenor usam ferramentas do método científico para confirmar se determinada pintura é autêntica ou não. Partindo de evidências muitas vezes anedóticas e escassas, o trio de especialistas dá início a investigações que buscam por provas documentais, reviram catálogos de casas de leilão e comerciantes de pinturas, caçam o local exato onde uma paisagem foi pintada e submetem os quadros em questão a exames dignos de qualquer investigação de ponta: análises químicas de amostras de tinta, radiografias, fotografias em alta resolução sob infra-vermelho e ultra-violeta.

Traçar a jornada de uma pintura, da última pincelada do artista ao seu mais recente dono pode revelar não apenas uma possível falsificação mas também segredos familiares e lapsos nos registros dos historiadores da arte. Com tantos elementos cativantes, essa série da BBC disponibilizada na Netflix tem dois graves defeitos: 1) apenas a 4ª. temporada está no catálogo. São somente quatro episódios (cerca de 1 hora cada) que tratam de cinco pinturas atribuídas aos artistas britânicos L. S. Lowry, Alfred Munnings, Winston Churchill (sim, aquele Winston Churchill, que pintava nas horas vagas), ao francês Renoir e a um misterioso mestre italiano do século XVI. 2) a qualidade da legendas, bem abaixo do esperado para uma produção da BBC (são frequentes erros de digitação e de tradução como “pitas” em vez de “pistas” e “ajudar-lo” em vez de “ajudá-lo”). Também seria melhor traduzir o título com algo mais próximo ao original: Fortuna ou Fake, por exemplo. Com exceção dessas limitações, é uma série altamente recomendável para quem gosta de investigação, arte e ciência — e sem dúvida merece ter mais temporadas e episódios no catálogo nacional da Netflix. O vídeo a seguir, embora não seja um clipe oficial, mostra os bastidores de uma gravação feita em 2013:

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O que vi em outros janeiros: 2017  e 2018.

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